TJRS afasta cobrança de ITBI em permuta com reserva de fração ideal
- Caroline Maciel Rodrigues
- 3 de jul.
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Recentemente, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (“TJRS”) proferiu duas decisões relevantes que afastam a incidência do ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis) em operações de permuta com reserva de fração ideal do terreno.
A controvérsia teve origem em exigências do Município de Gramado e do Cartório de Registro de Imóveis local, que passaram a condicionar a averbação da obra e a individualização das matrículas ao recolhimento do ITBI sobre os imóveis correspondentes à fração ideal do proprietário do terreno, mesmo nos casos em que o proprietário do terreno não transferia a fração à incorporadora, mas apenas a reservava contratualmente.
Essa questão foi levada ao Judiciário, por meio de uma dúvida registral e um mandado de segurança.
Dúvida Registral – 19ª Câmara Cível do TJRS
Na dúvida registral, o juízo de primeira instância julgou a demanda favoravelmente à exigência do imposto. No entanto, em grau recursal, a 19ª Câmara Cível do TJRS, acompanhando parecer do Ministério Público, reformou a decisão, reconhecendo a inexigibilidade do ITBI na hipótese, conforme ementa abaixo transcrita:
APELAÇÃO CÍVEL. REGISTRO DE IMÓVEIS. DÚVIDA. EXIGÊNCIA DE PRÉVIO RECOLHIMENTO DE ITBI (IMPOSTO SOBRE A TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS) SOBRE ÁREA CONSTRUÍDA PERMUTADA, PARA AVERBAÇÃO DA OBRA, INDIVIDUALIZAÇÃO DAS UNIDADES AUTÔNOMAS E REGISTRO DA INSTITUIÇÃO DE CONDOMÍNIO NA MATRÍCULA. SENDO DE RESPONSABILIDADE DO REGISTRADOR FISCALIZAR O PAGAMENTO DOS TRIBUTOS APLICÁVEIS AO ATO PRETENDIDO PELA PARTE, CONSOANTE ART. 289 DA LEI DOS REGISTROS PÚBLICOS, INEXISTE ILEGALIDADE OU ABUSO EM ATOS DESSA NATUREZA PRATICADOS PELA SERVENTIA. NA HIPÓTESE, HOUVE PERMUTA DE PARTE DO IMÓVEL, RETIDA FRAÇÃO IDEAL, SEM TRANSFERÊNCIA DE PROPRIEDADE, PARA CONSTRUÇÃO DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO, DESCABENDO A EXIGÊNCIA DE RECOLHIMENTO DO REFERIDO TRIBUTO, CONFORME ENTENDIMENTO DO STF NO TEMA 1.124 E NAS SÚMULAS 110 E 470. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA REFORMADA PARA IMPROCEDENTE. DERAM PROVIMENTO AO RECURSO. (Apelação Cível, Nº 50010872920238210101, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Augusto Guimaraes de Souza, Julgado em: 27-02-2025)
Mandado de Segurança – 1ª Câmara Cível do TJRS
No mandado de segurança impetrado contra a Secretaria da Fazenda do Município de Gramado, o juízo de primeira instância também julgou favoravelmente à incidência do imposto, mas a sentença foi reformada pela 1ª Câmara Cível do TJRS, que, acompanhando novamente parecer do Ministério Público, decidiu que não há transmissão de propriedade quando o terreneiro reserva a propriedade de fração ideal. Portanto, também nesse caso, não incide o ITBI. Veja a ementa:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ITBI. CONSTRUÇÃO EM FRAÇÃO IDEAL NÃO TRANSMITIDA. NÃO INCIDÊNCIA. I. CASO EM EXAME: Mandado de segurança impetrado com o objetivo de afastar a exigência de ITBI incidente sobre unidades autônomas construídas em fração ideal de terreno que permaneceu sob a propriedade de uma das impetrantes, após contrato de permuta com incorporadora. Alegou-se que a exigência tributária é indevida por não ter havido transmissão de domínio e por configurar bitributação, diante do pagamento de ISS pela edificação. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: A questão em discussão consiste em verificar a exigibilidade do ITBI sobre as unidades autônomas construídas em fração ideal de terreno não transmitida à incorporadora, à luz do fato gerador do imposto e do regime da propriedade condominial, com exame de eventual bis in idem. III. RAZÕES DE DECIDIR: A preliminar de inadequação da via eleita foi rejeitada, pois o mandado de segurança é ação adequada à tutela de direito líquido e certo contra exigência tributária indevida, nos termos do art. 5º, LXIX, da CF/1988 e da Lei nº 12.016/2009. No mérito, restou demonstrado que a fração ideal do terreno (825,33m²) permaneceu sob titularidade da impetrante G4 Participações Ltda., não havendo transmissão de domínio à construtora Bavaria Urbinc. A edificação das 16 unidades foi pactuada como obrigação de fazer em permuta por área construída, inexistindo fato gerador do ITBI conforme o art. 35 do CTN. A unidade autônoma e sua fração ideal constituem bem indivisível, sendo inaplicável a cobrança sobre edificação que não foi objeto de transmissão. A jurisprudência do STF (Súmulas 110 e 470) afasta a incidência do ITBI sobre construções realizadas posteriormente à aquisição do terreno, inclusive em hipóteses de permuta com reserva de fração ideal. Ademais, a exigência tributária sobre edificação já tributada pelo ISS e sobre fração já onerada pelo ITBI configura bis in idem, vedado pelo ordenamento jurídico. IV. DISPOSITIVO: Recurso provido para reformar a sentença e conceder integralmente a segurança, reconhecendo a inexigibilidade do ITBI sobre as unidades construídas na fração ideal não transmitida, determinando a abstenção da cobrança pela autoridade impetrada e o reembolso das custas processuais. RECURSO PROVIDO. (Apelação Cível, Nº 50083164020238210101, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relatora: Isabel Dias Almeida, Julgado em: 30-06-2025)
Conclusões
A decisão do TJRS na dúvida registral transitou em julgado, ou seja, não cabe mais recurso. Ainda cabe recurso da decisão no mandado de segurança.
Ambas as decisões são relevantes e representam uma mudança significativa no entendimento sobre a incidência do ITBI nessas operações, com impacto relevante no mercado imobiliário.
Os julgamentos fortalecem a tese de que não incide ITBI sobre as unidades entregues ao terreneiro que tenha reservado fração ideal do terreno. Isso resulta na redução dos custos envolvidos nesse tipo de negócio e, caso a segunda decisão também transite em julgado na forma em que proferida, será um precedente importante para requerer a restituição de valores pagos a título de ITBI em situações semelhantes.
Casos como esse evidenciam a importância de contar com uma assessoria jurídica especializada, capaz de orientar e proteger os interesses envolvidos em negociações imobiliárias complexas.
Os núcleos Tributário e Empresarial Consultivo da Ody Keller Advogados estão à disposição para esclarecimentos sobre o assunto.

Caroline Maciel Rodrigues Advogada - OAB / RS 97.789 caroline@odykeller.com.br

Pedro Corrêa Júnior
Advogado - OAB / RS 125.371