O Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seu artigo 2º, define "consumidor" como qualquer pessoa que adquire ou utiliza produtos ou serviços para fins não comerciais, ou seja, como destinatário final. Embora o CDC tenha sido inicialmente pensado para proteger os consumidores pessoas físicas, a legislação também pode ser aplicada às pessoas jurídicas, desde que se encaixem nos critérios previstos pela teoria finalista.
No entanto, a aplicação das normas protetivas do CDC às empresas exige uma análise detalhada, pois, ao contrário das pessoas físicas, a vulnerabilidade das pessoas jurídicas não é presumida. Ou seja, é necessário verificar se a empresa se encontra em uma situação de desvantagem ou fragilidade diante do fornecedor.
No entanto, a aplicação das normas protetivas do CDC às empresas exige uma análise detalhada, pois, ao contrário das pessoas físicas, a vulnerabilidade das pessoas jurídicas não é presumida. Ou seja, é necessário verificar se a empresa se encontra em uma situação de desvantagem ou fragilidade diante do fornecedor.
Em outras palavras, se a empresa provar sua hipossuficiência técnica, econômica ou jurídica, poderá ser reconhecida como consumidora e ter acesso à proteção do CDC.
Para entender como o STJ aplica essas normas, podemos analisar alguns casos emblemáticos:
Aquisição para desenvolvimento de atividade econômica: No julgamento do REsp 2.020.811 – SP, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi e julgado em 29/11/2022, uma empresa alegou sua vulnerabilidade ao adquirir serviços de intermediação de pagamentos online, visando à proteção sob as normas do CDC. Contudo, o STJ não reconheceu a hipossuficiência da empresa, pois não foram apresentadas provas de fragilidade técnica ou econômica. A Corte entendeu que, em transações envolvendo serviços ou produtos adquiridos para a atividade empresarial, não se pode presumir a vulnerabilidade sem evidências substanciais.
Empréstimos e insumos: Em outro julgamento, o REsp 1.497.574 – SC, de relatoria do Ministro Raul Araújo, julgado em 26/09/2023, o STJ não aplicou o CDC aos contratos de empréstimo firmados por uma sociedade empresária para financiar seus negócios. A decisão destacou a necessidade de diferenciar o que é adquirido como insumo (para produção ou revenda) do que é consumido diretamente. Assim, empresas que tomam empréstimos para impulsionar suas operações empresariais não se configuram como consumidores, a menos que provem a vulnerabilidade.
Contratos de empréstimo para capital de giro: Em decisão similar, no REsp 2.001.086 – MT, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, julgado em 27/09/2022, o STJ entendeu que contratos bancários para obtenção de capital de giro por pessoa jurídica não são considerados relações de consumo. A Corte argumentou que a obtenção de crédito para melhorar a operação da empresa não caracteriza aquisição para uso final, sendo necessária a comprovação de vulnerabilidade para que o CDC se aplique.
Aeronaves e bem de consumo: Em um caso envolvendo a compra de uma aeronave (AREsp 1.321.083 – PR, de relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 09/09/2014), o STJ reconheceu a empresa como consumidora, pois a aeronave foi adquirida para suprir uma necessidade interna da pessoa jurídica, e não para ser integrada diretamente ao mercado de produtos ou serviços oferecidos por ela. Assim, as normas do Código de Defesa do Consumidor foram aplicadas à relação. Para que isso ocorra, a Corte esclareceu que é necessário que o bem ou serviço adquirido seja utilizado de forma final, sem ser destinado ao processo produtivo.
Contratos de seguro: O STJ também tem reconhecido empresas como consumidoras em casos envolvendo contratos de seguro. No REsp 1.660.164 -SP (de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellize, julgado em 17/10/2017), e no AREsp 1.392.636 – SP (de relatoria do Ministro Raul Araújo, julgado em 09/04/2019), o colegiado reforçou o entendimento de que uma empresa que contrata um seguro para proteger seu patrimônio está adquirindo um serviço como destinatária final, o que justifica a aplicação das regras do CDC.
Por meio dos casos, acima descritos, foi possível concluir que a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor a pessoas jurídicas depende de uma análise detalhada do caso concreto, especialmente no que se refere à vulnerabilidade da empresa em relação ao fornecedor e a destinação final do uso do bem.
Embora a legislação permita que as empresas se enquadrem como consumidoras, a simples condição de ser uma empresa não garante automaticamente a proteção do CDC, é necessário comprovar a hipossuficiência, técnica ou econômica, para que as regras protetivas sejam aplicadas, como demonstrado nas decisões do STJ.
Se você quiser saber mais informações sobre o tema, o Núcleo de Direito Empresarial da Ody Keller está à disposição.
Melina Dreher Siebel Advogada - OAB / RS 132.253 melina.siebel@odykeller.com.br