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Redução da SELIC e o efeito na inflação

LUÍS ANTÔNIO LICKS MISSEL MACHADO | luis@biason.com.br

As notícias a que se tem acesso pela mídia fazem parecer que para evitar uma crise econômica basta reduzir a taxa de juros. Com base nisso, o Banco Central não encontra adversários para sua política de redução da taxa SELIC a cada reunião do Comitê de Política Monetária (COPOM).

A principal resposta que se ouve em apoio à redução da taxa SELIC é a de que “os juros estão muito altos, por isso que tem que reduzir”. Acontece que as pessoas, quando respondem isso, estão pensando em baixar os juros que elas pagam no crediário. Pensam que vai baixar os juros que pagam no cheque especial. Mas não é bem assim que acontece e, além disso, há o efeito inflação na economia nacional, tanto que até bem recentemente o Banco Central estava evitando reduzir essa taxa SELIC.

Para a economia popular a taxa SELIC influencia, em primeiro lugar, o valor que o Banco paga para quem aplica o dinheiro. Ou seja, quem conseguiu guardar algum dinheiro, e aplica no banco, irá receber juros menores, pois grande parte dos investimentos de renda fixa é baseada em títulos lastreados pela SELIC.

A SELIC também influencia o valor que os contribuintes recebem na devolução do imposto de renda. O governo cobra antecipado o imposto do contribuinte, e depois devolve corrigido pela SELIC para quem pagou impostos a mais durante o ano. Portanto, as pessoas e as empresas receberão menos na devolução do imposto de renda ou outros tributos pagos a maior.

Os juros que incidem sobre o crediário que a população faz nas lojas, ou os juros sobre o cheque especial seguem outra lógica econômica: se quem empresta o dinheiro corre o risco de não receber de volta o dinheiro que emprestou, então cobra juros mais altos de todos para quem empresta, pois assim, se apenas alguns pagarem a dívida, os credores acabam por recuperar os prejuízos causados por aqueles que dão o calote. Assim também funciona com as lojas que vendem no crediário e com os bancos.

A redução da SELIC até tem certo efeito sobre o cálculo de quanto os bancos cobram de juros no cheque especial, porém, dados econômicos apontam que a redução da SELIC não tem se refletido no spread bancário, que significa justamente a diferença entre as taxas que as instituições financeiras pagam para captar recursos e as taxas que cobram do cliente final (de quem pega dinheiro emprestado), e isso se dá justamente porque o peso da inadimplência é mais considerado nesse cálculo de fixação dos juros.

Portanto, na prática, como a inadimplência no Brasil é alta, e os dados demonstram que a inadimplência é o fator que mais influencia na fixação desses juros, o benefício da redução da SELIC acaba por não se refletir em grande vantagem para quem empresta dinheiro do banco ou compra a prazo.

Mas então por que as empresas, sindicatos e o governo estão apoiando essas medidas de baixa da SELIC a cada reunião do COPOM? A resposta não é simples, mas passa, obviamente, pelo interesse de cada um que apóia a medida. Para o governo, a principal justificativa, e que não é dita ao público em geral, é exatamente que a crise chegou ao Brasil, fazendo com que muitas empresas do setor produtivo não consigam vender o que produzem, e consequentemente tenham que demitir empregados. E tudo isso vira uma combinação perigosa, pois a economia é uma verdadeira “roda-viva”: se as pessoas perdem o emprego, ficam sem dinheiro para comprar, e as empresas que já não estão vendendo, ficam com ainda menos chance de vender.

Para os sindicatos, ao que parece, estão apoiando as medidas justamente para assegurar o emprego de seus sindicalizados, além de assegurar sua arrecadação, pois quanto mais gente empregada no seu setor, maior é a arrecadação sindical. Fora os sindicatos comprometidos com o governo, se é que se pode dizer que algum deles o é, e que apóiam incondicionalmente qualquer política econômica anunciada.

Já para as empresas, que são as primeiras a sentirem o efeito da crise, e que estão com estoques parados, não é interessante que as pessoas guardem seu dinheiro no banco “rendendo juros”. É melhor para as empresas que quem tiver dinheiro em mãos não se sujeite a receber juros baixos e que tire o dinheiro do banco para comprar, consumir os produtos que foram fabricados.

Porém, se isso de certa forma resolve o problema a curto prazo, por outro lado traz efeitos negativos a longo prazo para a economia. A baixa desses juros representados pela taxa SELIC força a alta da inflação. Tanto é verdade isso, que o governo vinha aumentando essa taxa a cada reunião do COPOM, sempre tentando reduzir a inflação que já começa a fugir do controle.

A economia funciona pela lógica da oferta e da demanda, e isso significa que quando muitos têm dinheiro em mãos e querem comprar um determinado bem, o proprietário pode fazer uma espécie de leilão entre os interessados, o que faz com que o preço suba e os compradores se sujeitem a isso. Do contrário, quando há um limite de dinheiro no mercado, o proprietário tem que fazer um preço cada vez mais baixo até que alguém ache ser um bom negócio.

Então, afinal, como é que a SELIC baixa faz aumentar a inflação? Essa resposta não é tão complicada: se deixar o dinheiro no banco não rende bons juros, então as pessoas e as empresas sacam seus investimentos financeiros, e acabam procurando outros bens para investir (imóveis, matéria-prima, etc) ou simplesmente gastam o seu dinheiro com roupas, móveis e viagens. Ou seja, existindo mais dinheiro no mercado, aumenta a procura de bens e serviços, e tudo começa a aumentar de preço. Ou seja, de um lado se desafogam estoques, mas na verdade isso é apenas um gatilho do processo inflacionário e que pode trazer prejuízos ainda maiores no mercado.

É por isso que os cientistas econômicos estavam prevendo, no início do ano, a manutenção das altas taxas de SELIC, pois já se havia detectado que a inflação fugiu do controle do governo, eis que o Banco Central, a cada manifestação pública, segue prevendo um aumento maior da ultrapassagem da meta inflacionária para o ano. E uma das estratégias de conter a inflação é justamente aumentar a SELIC, pois aí as pessoas e empresas preferem guardar seu dinheiro no banco rendendo juros, fazendo com que o mercado tenha que reduzir seus preços de matéria-prima e produtos finais para poder vender.

Porém, possivelmente pelos motivos já explicados, a decisão da autoridade monetária foi a de baixar a SELIC. Optou-se por estimular as pessoas e empresas a retirarem seu dinheiro dos bancos para consumir, entendendo que o mais importante no momento é que a economia não “congele”, ainda que isso seja conseguido com o sacrifício da estabilidade da inflação.

De tudo o que se pode observar, a única conclusão é que não se pode dizer que essa crise seja apenas uma “marolinha”.

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